Por Frank Mulder, da IPS
Utrecht, Holanda, 23/11/2010 – Muito do crescimento chinês não é produtivo e traz consigo “uma enorme especulação que amplia a brecha entre ricos e pobres”, disse o economista liberal Wang Jianmao, da Escola Internacional de Negócios China-Europa, com sede em Xangai. Números cor-de-rosa fazem com que o país seja tentado a adiar uma reforma muito necessária, afirmou. Além disso, o governo chinês está “muito centrado na velocidade. Porém, assim como um barco precisa reduzir a velocidade para reparar seus motores, nossa economia precisa diminuir a velocidade se quiser abordar problemas estruturais que colocam em risco o crescimento futuro”, acrescentou Wang.
Há diferentes motores econômicos, como exportações, investimentos e consumo. “Entretanto, o motor vital do consumo não funciona na China. Se atrasarmos os reparos, os outros dois vão parar ao mesmo tempo. Não existe um único país que possa sustentar seu crescimento quando sua economia continua crescendo com dois dígitos”, ressaltou o especialista. Entre 2004 e 2007, o produto interno bruto da China aumentou mais de 10% ao ano, chegando em 2007 a 14,2%. Esse índice baixou para 9,6% e 9,1% em 2008 e 2009, respectivamente, mas Pequim espera voltar a registros superiores a 10% o mais rápido possível.
“Isso seria muito perigoso. Esse é o tipo de crescimento que se pede emprestado ao futuro. Para favorecer nosso potencial, necessitamos reformas institucionais que deveríamos ter feito há tempos”, disse Wang. Em um contexto de êxito, é fácil adiar medidas dolorosas. Este ano, 54 empresas chineses ganharam um lugar na lista das 500 maiores companhias, elaborada pela revista norte-americana Fortune, e três firmas chinesas estão entre as dez primeiras.
“Isso não significa que sejam produtivas. Têm acesso a quantias ilimitadas de dinheiro barato. Pagam juros inferiores à inflação. Continuam investindo até exceder seriamente sua capacidade, o que tem efeito negativo tanto sobre os benefícios como sobre os preços. Em outras palavras, desperdiçam dinheiro da população”, disse Wang. Obter grandes ganhos sem proporcionar valor agregado nem criação de empregos é uma estratégia ruim para um país que precisa com urgência que os consumidores gastem mais, ressaltou.
“Em lugar de apoiar as indústrias intensivas em matéria de capital, precisamos de pequenas e médias empresas, para criar postos de trabalho intensivos em matéria de mão-de-obra. Temos o maior mercado mundial de carros de luxo, e, ao mesmo tempo, temos pessoas em demasia ganhando apenas o salário mínimo”, disse Wang.
Segundo estatísticas oficiais, o desemprego é de apenas 4%. “Não creiam nisso. Contam apenas o desemprego formal e registrado nas cidades. Os contratos de curto prazo nas áreas rurais são contados como pleno emprego. O desemprego é elevado, mas as empresas não podem encontrar quantidade suficiente de pessoas porque há uma grande disparidade entre a oferta e a demanda”, disse Wang.
Jan van der Putten, assessor holandês de empresas que querem investir na China, reconhece os problemas, mas considera que é fácil culpar o governo. “Eles sabem muito bem que o consumo precisa crescer. Mas isso é muito difícil de implementar. O chinês médio gasta 30% de sua renda em alimentos. Isso é muito, e é resultado do modelo de desenvolvimento que se escolheu, centrado no exterior em lugar do interior”, ressaltou.
Felizmente, os preparativos para o novo plano quinquenal (2011-2015) exigem um foco em reformas estruturais, disse o Banco Mundial em sua Atualização Trimestral da China, divulgada há duas semanas. “Mudar o modelo de crescimento é, com toda razão, um objetivo primordial. O reequilíbrio não ocorrerá por si só: exigirá um significativo ajuste de políticas”, destacou. Contudo, segundo Jan, é muito difícil mudar os padrões na China. “Há tantas leis e regelações que os lideres locais se sentem livres para escolher quais querem implementar”, disse.
O maior obstáculo à muito necessária transição é a enorme especulação, disse Wang, que já trabalhou como especialista em assuntos chineses no Fórum Econômico Mundial. “Viver na cidade ficou proibitivo para muitas pessoas. Os preços continuam aumentando, o que leva a uma brecha sem precedentes entre ricos e pobres. Além disso, diminui a urbanização, que é absolutamente necessária para elevar o consumo. Nem mesmo se grava a mais-valia. E dizemos que somos um país socialista”, disse Wang.
O especialista disse que, às vezes, sente-se um pouco sozinho em sua luta para criar um imposto de mais-valia. E tem mais reformas na lista de desejos de Wang. Uma das mais importantes é livrar-se da política do filho único, que considera “absurda”. As “pessoas nunca gastam mais e agora menos do que quando não podem ter mais filhos para cuidarem delas quando ficarem velhas. O governo poderia permitir que cada casal tivesse dois filhos, ou mesmo três, se tanto marido como mulher fossem filhos únicos. Isso é necessário, além do mais, se quisermos estar prontos para quando a força de trabalho chinesa diminuir”, afirmou.
Segundo Jan, o governo está muito consciente disso. “Já permitiu ter um segundo filho se os pais forem filhos únicos. Há um debate aberto sobre esta política. Em uma região acabam de iniciar um experimento pelo qual é permitido que as pessoas tenham um segundo filho se um dos cônjuges é filho único”, explicou.
Desde 2009, a China é líder mundial no investimento em energias limpas. É o segundo país com maior capacidade instalada (52,5 gigawatts) derivada das energias renováveis, informou este ano o Pew Environment Group. Seus objetivos estão entre os mais ambiciosos do mundo. “No entanto, o gargalo para a sustentabilidade é a inovação. Gastamos em inovação menos do que em outros países, e o fazemos de maneira pouco efetiva, mediante empresas estatais”, afirmou Wang.
Ele acredita que os chineses conhecem bem a importância de não copiar o exemplo dos Estados Unidos. “O Japão é nosso ponto de referência: conseguiu tornar-se muito eficiente em matéria energética. Nossos hábitos também são muito diferentes dos costumes dos norte-americanos. Nós nunca comeremos tanta carne como eles, para mencionar um exemplo”, destacou.
Wang teme a corrida pelos recursos que Pequim realiza nos países em desenvolvimento. “A China tem que se dar conta de que a extração barata de recursos não é o mais inteligente que pode fazer. Devemos compreender que, se ajudarmos os países a se industrializarem, eles poderão comprar nossos produtos”, acrescentou. Envolverde/IPS
(IPS/Envolverde)
Fonte: http://www.envolverde.com.br
Nenhum comentário:
Postar um comentário